Por José Adriano
A discussão sobre a Reforma Tributária frequentemente esbarra no temor de impactos negativos sobre o capital de giro das empresas, especialmente com a introdução do modelo de split payment. No entanto, uma análise mais técnica e menos alarmista revela que essa ferramenta foi desenhada para ser inteligente e seletiva. Ao vincular o crédito do adquirente ao efetivo pagamento do tributo pelo fornecedor, o sistema cria um lastro financeiro robusto que elimina a inadimplência na cadeia e previne fraudes, trazendo uma segurança jurídica inédita para o ambiente de negócios brasileiro.
Diferente do que se observa em outros países, a tecnologia do nosso split payment promete respeitar os créditos já acumulados pelo fornecedor, evitando retenções desnecessárias que sufocariam o caixa. Na prática, se uma empresa tem créditos tributários disponíveis, a retenção no momento da venda será feita apenas sobre a diferença devida, e não sobre o valor total da nota. Isso demonstra um avanço significativo na modernização do nosso sistema, preservando a liquidez das companhias enquanto garante a arrecadação, transformando o fluxo de pagamentos em um mecanismo de conformidade automática.
Para o executivo financeiro, o ponto de atenção não deve ser o mecanismo de cobrança em si, mas a gestão da transição das alíquotas entre 2029 e 2033. Enquanto o split tende a antecipar o reconhecimento de créditos — permitindo sua apropriação imediata na data do pagamento, em vez de aguardar o mês seguinte —, o aumento gradual da carga de IBS e CBS exigirá uma revisão estratégica de preços. A partir de 2027, a precificação passará a ser líquida de impostos, demandando uma renegociação transparente com toda a cadeia de suprimentos para acomodar as novas alíquotas sem corroer as margens.
Em última análise, a Reforma Tributária não é apenas uma mudança de regras, mas uma transformação na cultura de formação de preços e na gestão de tesouraria. Com a extinção do PIS/Cofins e a possibilidade de creditamento sobre despesas financeiras, haverá um alívio relevante no custo do endividamento corporativo. O desafio agora é recalibrar os modelos internos para um cenário de maior transparência, onde a eficiência fiscal deixará de ser uma vantagem competitiva baseada em complexidade para se tornar um reflexo direto da organização e da conformidade da empresa.
Íntegra da matéria em https://valor.globo.com/legislacao/coluna/split-payment-e-fluxo-de-caixa-na-reforma.ghtml
