Por Rafael Pandolfo
Reformular integralmente o sistema de tributação do consumo, sem garantir meios rápidos e eficazes de acesso ao Poder Judiciário para corrigir excessos, é o mesmo que inaugurar uma sala de cinema sem saídas de emergência. Em caso de problemas, ninguém saberá para onde correr.
Tenho insistido nesse ponto desde o início dos debates sobre a reforma tributária. Votou-se a emenda constitucional que deu início ao novo regime tributário, mas adiou-se para um momento posterior a definição de um caminho essencial, sem o qual as garantias dos contribuintes ficam ameaçadas pela ausência de um instrumento adequado e de uma rota clara de acesso ao Judiciário.
Para entender o labirinto em que o contribuinte se encontra, basta observar que, pelas regras atuais, qualquer discordância sobre o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) deveriam ser resolvidas, a princípio, na esfera estadual, enquanto as disputas envolvendo a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) teriam como foro competente a Justiça Federal.
Mas a legislação que regula esses dois tributos não é a mesma? Sim, é a mesma e, no modelo atual, estará sujeita às variações de entendimento de todos os tribunais estaduais, além dos tribunais regionais federais. Em outras palavras, se mantido o cenário constitucional atual, a instabilidade e a multiplicidade de distintas decisões judiciais sobre a mesma matéria constituirão o novo cenário.
Assim, no caso do IBS, por exemplo, uma empresa poderá obter decisões diferentes em cada estado onde realize operações interestaduais. Sendo assim, controvérsias sobre o mesmo dispositivo legal podem ter desfechos opostos: um na Justiça Federal (CBS) e outro na Justiça Estadual (IBS).
Reformar o plano normativo sem pensar na estrutura jurisdicional, que será responsável por dar a palavra final, apaziguar conflitos e conter excessos das previsíveis pretensões fazendárias, é uma omissão que pode gerar sérios danos aos contribuintes e ao ambiente econômico.
A esperança, nesse imbróglio jurídico, repousa, hoje, na recente iniciativa do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Sob liderança do Ministro Barroso, foi criado um grupo de trabalho que terá 45 dias para apresentar um anteprojeto de emenda constitucional com propostas para adequar o processo tributário à nova realidade.
A expectativa é que essa nova “sala de cinema” seja inaugurada com sua indispensável saída de emergência. Caso contrário, arriscamos assistir a um verdadeiro filme de terror.