Reforma tributária e o impacto nos contratos privados

Por Natália de Oliveira Souza Yonashiro

Ainda que a reforma tributária seja frequentemente abordada sob a ótica estritamente fiscal, suas repercussões se estendem para outras áreas do Direito. Com a promulgação da LC 214/25, o novo modelo tributário reestrutura significativamente o sistema de arrecadação e, como consequência, altera as bases econômicas de muitos contratos firmados sob a lógica anterior, resvalando na esfera do Direito Contratual.

A introdução de tributos como o IBS – Imposto sobre Bens e Serviços e a CBS – Contribuição sobre Bens e Serviços, que substituem diversos tributos Federais, estaduais e municipais, modifica substancialmente o regime de incidência fiscal sobre operações comerciais rotineiras.

Embora ainda não seja o momento adequado para simulações detalhadas ou adoção de calculadoras tributárias – já que as alíquotas ainda não estão definidas e diversas matérias dependem de regulamentação infralegal -, é importante evitar a inércia no que tange à reavaliação dos contratos. 

Isso porque os efeitos jurídicos da reforma são suficientemente previsíveis: a mudança do regime de tributação terá impacto direto sobre a estrutura de custos e receitas previstas em contratos privados, especialmente os de prazo mais longo. Portanto, a adoção imediata de medidas jurídicas nos contratos e negócios em vigor é prioridade, mesmo em cenário de incerteza normativa sobre percentuais e forma de cobrança.

Essa mudança afeta diretamente contratos privados em andamento, sobretudo aqueles com vigência estendida, os quais podem apresentar desequilíbrio caso não prevejam mecanismos de adaptação às novas condições, o que pode comprometer a sua execução. Isto exige que as partes estejam atentas para evitar desequilíbrios econômicos e possíveis litígios futuros.

E é precisamente aqui que se intensificam os riscos jurídicos para as empresas:

Litígios prolongados e custosos, resultantes da ausência de cláusulas claras sobre como adaptar o contrato à nova realidade tributária;
Rompimento contratual por inadimplemento, diante do aumento inesperado de custos que inviabiliza a execução pela parte mais onerada;
Reequilíbrios unilaterais ou negociações forçadas, muitas vezes conduzidas sob tensão, desequilibrando a relação contratual originalmente pactuada;
Insegurança jurídica e risco reputacional, que se ampliam em ambientes empresariais marcados por incertezas, judicialização e quebra de previsibilidade.
A ausência de previsões contratuais que contemplem ajustes decorrentes da reforma tributária não apenas pode resultar em litígios onerosos e prolongados, como também compromete a estabilidade da relação negocial e a reputação empresarial envolvida. Isto evidencia o papel do Direito Contratual nas relações privadas, essencialmente na instrumentalização de cláusulas que visam garantir uma relação contratual equilibrada e funcional ao longo do tempo.

Como exemplo, podemos citar a cláusula de reajuste tributário, que permite a revisão dos valores contratuais em caso de alteração na carga tributária incidente sobre o objeto do contrato, bem como a de revisão para manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, que assegura a renegociação dos termos contratuais caso ocorram mudanças legislativas que impactem substancialmente as bases econômicas do contrato.

Revisar contratos vigentes, reavaliar cláusulas e redigir novos instrumentos, com atenção aos impactos fiscais, não é apenas uma medida de cautela: é um passo fundamental para garantir segurança jurídica, a previsibilidade e o equilíbrio nas relações comerciais contemporâneas. E será estratégico na adaptação das relações privadas ao novo ambiente tributário, ao proteger os interesses das empresas envolvidas e mitigar os riscos contratuais que já se avizinham.

https://www.migalhas.com.br/depeso/430049/reforma-tributaria-e-o-impacto-nos-contratos-privados

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