Paes critica reforma tributária e diz que centralização da arrecadação deixa prefeitos ‘com pires na mão’

Por José Adriano

A crítica do prefeito Eduardo Paes à Reforma Tributária recoloca na mesa um ponto sensível que muitos gestores evitam admitir: a centralização fiscal continua sendo um dos principais gargalos do pacto federativo brasileiro. Quando a arrecadação se desloca do nível local para Brasília, mesmo sob a promessa de redistribuição futura, nasce um descompasso entre responsabilidade e capacidade financeira. Prefeitos seguem respondendo por serviços essenciais na ponta, mas dependem cada vez mais de fluxos sobre os quais não têm controle. Esse é o pano de fundo do alerta feito por Paes ao afirmar que a reforma, da forma como está estruturada, representa um retrocesso.

A criação do IBS e da CBS simplifica, sem dúvida, o modelo tributário brasileiro, algo que defendemos há anos. Mas a simplificação, por si só, não resolve o problema da autonomia municipal. Ao substituir ISS e ICMS por um imposto de gestão compartilhada, o desenho atual empurra os municípios para uma posição de dependência do Comitê Gestor. Em outras palavras, aquilo que antes era receita própria passa a ser receita administrada, e isso fragiliza especialmente cidades com alta demanda por infraestrutura, serviços públicos e investimentos contínuos. A imagem do prefeito com o “pires na mão”, apesar de dura, sintetiza a experiência de décadas de idas e vindas a Brasília em busca de repasses.

Esse movimento se agrava quando observamos que quase um terço dos municípios já tem dificuldade para fechar o ano fiscal. A carta apresentada pela Ubam reforça o cenário: quedas no FPM, incremento das obrigações municipais, instabilidade nos índices de repasse e a necessidade urgente de corrigir distorções históricas na distribuição de receitas. A Reforma Tributária, ao não enfrentar esse desequilíbrio com mecanismos claros de compensação e critérios estáveis de repartição, corre o risco de ampliar as assimetrias que deveria reduzir. A transição até 2033 será determinante para definir se a mudança será um avanço ou um problema regulatório permanente.

O debate, portanto, não é sobre ser contra ou a favor da reforma, mas sobre garantir que ela cumpra seu papel de modernizar o sistema sem esvaziar a capacidade fiscal dos municípios. Reforma tributária boa é aquela que simplifica, distribui melhor, reduz litígios e fortalece todos os entes federados, não apenas a União. Se quisermos um Brasil mais equilibrado, precisamos de um desenho que reconheça o peso das cidades no dia a dia dos cidadãos. Prefeitos não podem ser meros executores de políticas sem recursos para implementá-las. A sustentabilidade fiscal local deveria ser um pilar, não um apêndice do processo.

Baseado na matéria publicada em https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/11/27/paes-critica-reforma-tributaria-e-diz-que-centralizacao-da-arrecadacao-deixa-prefeitos-com-pires-na-mao.ghtml

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