Como a Reforma Tributária vai afetar a locação de imóveis

Reforma Tributária sobre o consumo mexeu bastante com a atividade de locação de imóveis. Embora ainda não seja possível quantificar com exatidão qual será o impacto sobre os contribuintes, os especialistas dão como certo um aumento da carga tributária. Espera-se que o mercado passe por um período de acomodação. Alguns possíveis efeitos são a tentativa de repassar o aumento da carga para os locatários – o que terá maior ou menor sucesso a depender do cenário econômico – e a redução da atratividade das holdings imobiliárias. Estes e outros aspectos dos impactos da Reforma Tributária sobre a atividade de locação de imóveis foram discutidos no encontro Legislação & Debates, realizado no último dia 29 de abril.

O que muda para as empresas que alugam imóveis para terceiros?

Hoje, pessoas jurídicas imobiliárias (como holdings imobiliárias), que geralmente estão no regime do lucro presumido, não pagam impostos estadual e municipal  (ICMS e ISS) quando alugam imóveis para terceiros. Elas pagam impostos federais que incidem sobre a renda (Imposto de Renda) e o consumo: recolhem o Pis e a Cofins, que, somados, têm alíquota de 3,65%. “A tendência é ter um aumento da carga tributária”, afirma Thiago Braichi, sócio do Freitas Ferraz Advogados.

Esse aumento ocorrerá porque, com a Reforma Tributária (PEC 132/23), a atividade imobiliária passará a pagar impostos estaduais e municipais. O aumento ocorrerá a despeito de o setor ser um dos setores diferenciados, que fará jus a uma redução de 70% na alíquota base do IVA Dual – formado pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que é de competência municipal e estadual, e a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal.

alíquota base do IVA Dual ainda não está definida – espera-se que fique em torno de 28%. Portanto, ao se aplicar um desconto de 70% sobre os 28%, chega-se a uma alíquota de 8,4%. Ou seja, o aumento seria de 3,65% (percentual do Pis e da Cofins) para 8,4% (70% de desconto sobre a alíquota base da CBS e do IBS).

Braichi calcula que, se forem acrescentados ainda os impostos que incidem sobre a renda (CSLL e IRPJ), a alíquota total que incide sobre a atividade de locação, que é hoje de 14,53%, deverá alcançar de 18,5% a 20%, a depender da alíquota base do IVA Dual.

O que muda para as pessoas físicas que alugam imóveis para terceiros? 

Paula Chaves, sócia do Coimbra, Chaves & Batista Advogados, explica que, embora o foco da Reforma seja os impostos sobre o consumo (ISS, ICMS, IPI, Pis e Cofins), ela também mexeu com as pessoas físicas. “A diferença para a pessoa física é muito mais relevante do que quando se fala da tributação da pessoa jurídica”, afirma a advogada.

Quando as pessoas físicas alugam imóveis para terceiros, hoje só pagam o IR, cuja alíquota varia de 7,5% a 27,5%, e é recolhido por meio do carnê leão. Mas o artigo 251 da Lei Complementar 214/25 prevê que as pessoas físicas também podem ser enquadradas como contribuintes regulares do IBS e da CBS – impostos que incidem sobre o consumo.

Chaves explica que são dois critérios para enquadrar uma pessoa física como contribuinte regular. Um deles leva em conta o exercício do ano anterior. Se a pessoa locou mais de 3 imóveis e teve receita anual de aluguel a 240 mil reais, essa pessoa vai pagar também o IBS e a CBS no ano seguinte. “É importante dizer que o critério é cumulativo”, afirma Chaves. Um exemplo: se a pessoa alugou apenas um imóvel e ganhou mais que 240 mil, não deverá o IBS e a CBS. Ou se ganhou menos de 240 mil com o aluguel de cinco imóveis, também não.  O valor de 240 mil será atualizado pela correção do IPCA desde a publicação da lei (que ocorreu em janeiro de 2025).

O segundo critério diz respeito ao ano corrente: se a pessoa física tiver renda de aluguel superior a 288 mil reais, passaria a ser contribuinte regular do IBS e da CBS. Nesse critério, não se leva em consideração o número de imóveis.

No total, a carga vai aumentar para os contribuintes regulares (que se enquadram em um dos dois critérios). Chaves estima que, caso a pessoa física recolha um IR à alíquota de 27,5%, poderá ter de pagar um total de 35,9% se for enquadrado como contribuinte regular (o cálculo considera, além do IR, o IVA Dual já com o redutor de 70%).

A sócia do Coimbra, Chaves & Batista lembra que há uma regra específica para a locação por temporada – que será ainda mais afetada. Quando as locações forem por menos de 90 dias, os serviços serão considerados de hotelaria e não de locação. E, sobre os primeiros, o redutor aplicado sobre o IVA Dual é menor (40%) do que o de locação (70%). Portanto, a conta do locador por temporada ficará mais salgada. Chaves estima que a carga, considerando o IR e o IVA Dual, pode chegar a 45%.

Efeitos da Reforma Tributária sobre o mercado imobiliário 

Com o esperado aumento da carga tributária, os especialistas acreditam que o mercado vai passar por um período de adaptação que pode incluir a busca pela revisão dos contratos (para aumentar os preços dos aluguéis) e a possível migração para outros tipos de investimento, ainda mais num cenário de juros elevados, como o atual. “A tendência é que sobre menos dinheiro no bolso do investidor, a não ser que ocorra um reequilíbrio do contrato”, afirma Braichi, do Freitas Ferraz Advogados. “Talvez isso incentive as pessoas a pensar em outros tipos de investimento.”

Já Michel Siqueira Batista, sócio do Vieira Rezende Advogados, considera provável que haja uma baixa de margem na atividade de locação, pois será difícil repassar integral e instantaneamente a carga para o locatário. “As alterações trazidas pela Reforma Tributária vão exigir dos contribuintes uma mudança de postura”, afirma. Ele lembra que um dos pilares da reforma é a não-cumulatividade, que será operada por meio da tomada de créditos (o contribuinte pode abater, do imposto a pagar, determinadas despesas). No setor de locação, diz Batista, não se espera que essas deduções sejam grandes, mas elas podem se tornar o “pulo do gato” especialmente para quem aluga imóveis por temporada e arca com os custos correntes e também com a manutenção do imóvel. “Na medida em que se consiga deduzir [do imposto a pagar] algumas despesas, isso pode ser um alívio”, diz Batista.

Caio Malpighi, associado do Vieira Rezende Advogados, considera que o aumento potencial dos impostos é quase certo, mas que ainda não é possível saber exatamente qual será. Isso porque as alíquotas nominais não representam a carga efetiva por conta da sistemática de créditos do imposto. “Quando as alíquotas tiverem sido determinadas, o contribuinte vai ter que sentar e calcular na ponta do lápis para ver o que vai deduzir de créditos e ver quanto efetivamente teve de aumento dar carga tributária.”

Ele lembra que, embora o custo do tributo tenda a ser repassado para o locatário (elevando o preço da locação), a depender da oferta e demanda no mercado, pode ocorrer o inverso: a redução do preço da locação e da rentabilidade dessa atividade.

O futuro das holdings imobiliárias 

Malpighi, do Vieira Rezende, espera uma modificação nas estruturas jurídicas. “Hoje em dia há um benefício grande na holding imobiliária, mas com o IBS e a CBS, a estrutura pode não ser tão benéfica do ponto de vista tributário”.

Chaves lembra que não há uma receita que se aplique a todos. “Além da reforma sobre o consumo, nos ainda teremos a reforma sobre a renda. Quando se avalia o melhor cenário, há também essa variável.” Essa peça do quebra-cabeça ainda está faltando para que as pessoas possam avaliar como estruturar suas atividades. No cenário atual, uma pessoa física que paga 27,5% de IR e for enquadrada como contribuinte regular passaria a pagar 35,9% de carga total (considerando também o IVA Dual). Comparando com a carga de uma holding, que será da ordem de 19,3%, esta última seria a opção mais vantajosa. Mas o IR também vai ser objeto de reforma – e os dividendos podem vir a ser tributados, o que mudaria o cenário. Outro ponto, diz Chaves, é que a holding imobiliária tem benefícios para a organização societária e de governança.

Fonte: https://legislacaoemercados.capitalaberto.com.br/

Íntegra do Debate abaixo:

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *