As particularidades do Imposto Seletivo

Por Joaquim Alves Rodrigues Pinto, Vanessa Carvalho

Com o advento da Emenda Constitucional 132/2023, no contexto da reforma tributária, foi acrescida ao artigo 153 da Constituição Federal nova competência à União Federal para instituir, mediante lei complementar, imposto sobre produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Trata-se do Imposto Seletivo que está previsto no inciso VIII do dispositivo constitucional e possui caráter extrafiscal. Ou seja, sua principal função é eminentemente regulatória, voltada a desestimular atividades ou produtos que gerem externalidades negativas, especialmente aqueles prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Nesse sentido, o imposto busca impor um ônus financeiro às práticas que afetam de forma adversa a saúde pública ou o meio ambiente, com o intuito de desestimular o consumo e a produção desses bens e serviços, induzindo o comportamento do mercado consumidor.

Assim, o Imposto Seletivo foi formalmente instituído e regulamentado pela Lei Complementar 214/2025, que cuidou de definir os bens e serviços considerados prejudiciais ao meio ambiente e à saúde, como: veículos, embarcações e aeronaves, produtos fumígenos, bebidas alcoólicas, bebidas açucaradas, bens minerais, concursos de prognósticos e fantasy sport.

Dessa forma, verifica-se que ao indicar os itens e, consequentemente, os setores que serão afetados pelo Imposto Seletivo, o legislador buscou discriminar os bens que considera prejudiciais à saúde pública e ao meio ambiente, em consonância com o objetivo indutor de comportamento.

Nesse sentido, o imposto possui caráter discriminatório de incrementação de preço, com o intuito de desestimular o consumo de itens específicos, e incidência aparentemente monofásica.

Contudo, diferente do que foi propagado para a criação do tributo, as características extrafiscais do imposto seletivo se limitam ao sobrepreço de itens, uma vez que a arrecadação do tributo não possuirá vinculação à receita do Estado para combate aos efeitos indesejados promovidos pelos itens prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

Isso porque a receita oriunda da arrecadação da espécie “imposto” é ordinária, de modo que não está atrelada a destinação específica, o que confere ao Estado liberdade para alocar os recursos conforme as prioridades estabelecidas pela gestão orçamentária.

Dessa forma, não há garantia da vinculação da receita oriunda do imposto seletivo para combate aos efeitos coletivos indesejados, de modo que o modelo brasileiro apenas adota a característica do sobrepreço, deixando de vincular a receita para despesas do Estado ao combate das externalidades negativas, o que poderia ser feito, caso a espécie tributária escolhida fosse “contribuição”.

Por esse motivo, pelas características apresentadas no novo imposto seletivo, parece-nos que se trata de um imposto sobre produtos industrializados com uma “nova roupagem”, ou melhor, com incidência única e seletividade mais restritiva e direcionada.

Isso porque, enquanto o Imposto sobre Produtos Industrializados incide sobre uma ampla série de produtos industrializados, com alíquotas diferenciadas com base na essencialidade do item, o Imposto Seletivo possui escopo limitado, recaindo exclusivamente sobre bens e serviços considerados prejudiciais à saúde e ao meio ambiente.

Acontece que, para fins de tributação de itens que geram externalidades negativas e cujo consumo possui dimensão moral, o Imposto sobre Produtos Industrializados já possui papel significativo na incrementação de preços para suposta redução do consumo, uma vez que cigarros, bebidas alcóolicas e veículos são “campeões” de arrecadação pelo imposto, conforme indicado na Análise da Arrecadação das Receitas Federais de novembro/2024, elaborada pelo Centro de Estudos tributários e Aduaneiros da Receita Federal[1].

É importante ressaltar que apesar de o IPI possuir função extrafiscal, sendo utilizado como forma de onerar itens, os quais também embarcam os supérfluos e nocivos à saúde, ele também cumpre uma importante função fiscal, já que é responsável por grande parte da arrecadação tributária federal sobre produtos industrializados.

Dessa forma, parece-nos certo, então, afirmar que o Imposto Seletivo traz uma nova roupagem a uma tributação sobre o consumo, agora, mais seletiva e orientada por critérios prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.

Assim, por mais que o objetivo fosse o alinhamento a práticas internacionais de desestímulo a determinados produtos, o instrumento não demonstra rigidez ao enfrentamento das temáticas no sentido ao direcionamento das receitas arrecadadas, de modo que identificamos uma tributação direcionada a certos setores, os quais já vinham sendo impactados pelo Imposto sobre Produtos Industrializados.


[1] Disponível em: https://www.gov.br/receitafederal/pt-br/centrais-de-conteudo/publicacoes/relatorios/arrecadacao-federal/2024/analise-mensal-nov-2024.pdf?utm_source=chatgpt.com. Acesso em 10 de julho de 2025.

https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/as-particularidades-do-imposto-seletivo

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *