Por Ana Luiza Tieghi
Na pandemia, quando o trabalho remoto nos escritórios se tornou uma realidade, o futuro de Alphaville parecia nebuloso. Agora, é a reforma tributária que coloca nova dúvida para a região, que, apesar disso, tem surpreendido o mercado. Em Barueri (SP), a 27 km de São Paulo, Alphaville se tornou um polo de escritórios nos últimos 20 anos. Tem, hoje, estoque de prédios similar à região da Chucri Zaidan, uma das maiores da capital paulista, conta Yara Matsuyama, diretora de locação de escritórios da consultoria JLL. Durante a pandemia, especialistas do setor temiam pelo futuro de Alphaville. Se estava difícil convencer colaboradores a voltar ao trabalho presencial em áreas fartas em transporte público e mais próximas da moradia, a distância de São Paulo e o acesso mais difícil poderiam afastar funcionários e empresas.
Para Matsuyama, no entanto, nada disso se concretizou. “Se você for para Alphaville às 9h, vai pegar o mesmo trânsito de antes, não aliviou nada”, afirma. De fato, a parcela de prédios vagos em Alphaville é apenas a sétima maior entre as áreas de escritório da capital, de 21,9 % no primeiro trimestre, ainda que fique um pouco acima da média da cidade, de 18,3 %. A vacância na região de Barueri já foi pior, chegando a 32,4 % no fim de 2022, mas tem se reduzido.
Ali, ocupantes de prédios corporativos se beneficiam de um ISS (Imposto Sobre Serviços) mais baixo, benefício concedido pela Prefeitura de Barueri, que cobra 2 % de alíquota para 90 % dos setores. No entanto, a reforma tributária, que começa a ser aplicada em 2029, com conversão total em 2033, vai mudar isso. Como explica André Menon, sócio do escritório Machado Meyer, o ISS é cobrado na sede do prestador de serviço, mas o imposto que vai substituí-lo, o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), será cobrado no destino do serviço. “Vamos ter, de fato, uma revisão da operação das empresas, para elas verificarem se ainda faz sentido permanecer onde estão, mesmo sem o benefício fiscal”, afirma. Ainda que o prazo da reforma seja longo, Menon conta que empresas já estão fazendo estudos de viabilidade.
Para Matsuyama, ainda é cedo para saber o impacto da reforma em Alphaville, porque outros fatores pesam na decisão das companhias sobre onde fincar seu escritório. O fato de a região estar à beira da rodovia Castello Branco e do Rodoanel pode atrair ocupantes que prezam pela facilidade logística, por exemplo. É o que acredita a prefeitura: “Barueri oferece diversos incentivos não fiscais para a permanência e instalação de novos escritórios”, incluindo “localização geográfica estratégica, infraestrutura urbana e corporativa de alto padrão, qualidade de vida e segurança e redes consolidadas de saúde e transporte público”, informou, em nota. Mesmo assim, a cidade já iniciou estudos para “identificar os possíveis impactos” da reforma tributária e as “medidas de mitigação necessárias”.
Consultorias imobiliárias classificam Alphaville como uma região alternativa, ou secundária. Ela atrai ocupantes ao conjugar empreendimentos de qualidade, incentivo fiscal e preços baixos. Na área de São Paulo, a região terminou o primeiro trimestre com o segundo menor preço médio para locação, de R$ 61 por metro quadrado, de acordo com a JLL. Só perde para a região da Marginal Sul, que cobra R$ 38. “Tem regiões de São Paulo que também estão muito competitivas em termos de preço”, diz Matsuyama. A Chácara Santo Antônio é outro bairro que, assim como Alphaville foi no passado, conta com prédios novos, de qualidade e a preço baixo — o valor médio ficou em R$ 75 por metro quadrado — e compete com ela.
Luis De Chiara, diretor de locações da CBRE, ressalta que, a depender do domicílio do funcionário, chegar em Alphaville é mais fácil do que em regiões mais ao sul da Marginal Pinheiros, que concorrem com ela. Desde 2021, segundo a JLL, só houve uma entrega de prédio novo em Alphaville, com 12,3 mil m² de área bruta locável (ABL), o que ajudou na redução da vacância. A CBRE contabiliza também a entrega de um prédio feito para a multinacional DuPont. Relatório da JLL de 2021, focado na região, apontava que outros quatro empreendimentos eram previstos. Um deles, com 1,6 mil m² de ABL, está em obras, sem previsão de entrega. Já as torres 4, 5 e 6 do complexo Castelo Branco Office Park, o principal da região, que estavam em fase de projeto, não saíram do papel. Seriam mais 100 mil m² de ABL.
No fim de março, Alphaville tinha 108 mil m² de escritórios vagos, segundo maior volume na região de São Paulo, atrás apenas da Chucri Zaidan, com 147 mil m². As três torres existentes do Castelo Branco foram feitas e já vendidas pela Tishman Speyer. Questionada sobre se pretende fazer outros projetos em Alphaville, a incorporadora afirmou, em nota, que “sempre avalia oportunidades que estejam alinhadas a sua estratégia de negócios”. Uma multinacional de grande porte que tem escritório na região desde 2010, mas pediu para não ser citada, afirma que o benefício fiscal teve impacto em sua mudança para Alphaville, mas que, hoje, empresa e colaboradores “já estão bem adaptados à região”. Desde a pandemia, a companhia reduziu sua área ocupada em 75 % e adotou o modelo de trabalho híbrido.
“A alíquota reduzida de ISS ainda é um fator importante para as empresas prestadoras de serviço se estabelecerem e continuarem na região”, afirma, acrescentando que, com a extinção do ISS, isso não será mais relevante. De Chiara analisa que a ocupação em Alphaville tem se dado principalmente por empresas de pequeno porte, diferentemente do que ocorreu na década passada. Com a redução contínua da vacância e o aumento de preço do aluguel em São Paulo, porém, Alphaville pode voltar “a ser alternativa de custo interessante”.