Por Natalia Caliari
A estrutura de finanças está em transformação para acomodar um ambiente complexo de negócios. Nesse cenário, como entregar mais com menos, mantendo diferenciais competitivos no longo prazo? Como equilibrar a gestão de riscos com uma agenda inovadora? E como contribuir para a saúde do negócio como um todo com as oportunidades da reforma tributária?
As respostas para estas perguntas passam pelo uso da tecnologia e de dados como habilitadores do conceito “touchless” (que dispensa o toque físico) para a área financeira. Trata-se de um novo patamar de entregas alavancadas pela hiper-automação, com processos inteligentes e fluídos com baixa intervenção manual.
O futuro que se desenha para a estrutura financeira vai aposentar o modelo do passado. Em vez de focar na proteção de valor por meio de mecanismos de controle e compliance, a tendência é impulsionar estratégias em toda a organização com a escalabilidade oferecida pela nuvem.
O objetivo da visão “touchless” é preencher a lacuna de soluções que não resolvem por completo problemas complexos, além da escassez e falta de dados de qualidade para tomar melhores decisões. Com a hiper-automação no centro, a estrutura financeira terá melhores condições de destravar valor para as empresas.
A estrutura do futuro das finanças
A nova área financeira nas empresas promove o alinhamento da tecnologia com as necessidades de negócios. Dessa união, surgem o redesenho dos processos de acordo com as capacidades de cada tecnologia e a construção de um mapa de ações adequado para a aplicação dos processos touchless.
Ao priorizar iniciativas que entregam benefícios tangíveis para a organização, a geração de valor parte de duas alavancas principais: a implementação de casos de uso de forma mais ágil e ganhos identificados rapidamente ao longo da jornada de transformação. Neste contexto, a reorganização da área financeira passa a contar com três engrenagens centrais:
1. Processos inteligentes e digitalizados (coleta de dados)
Ideais para reduzir custos, ajudar a criar insights baseados em valor e criar um ecossistema tecnológico conectado, com fluxo de informações. Alguns exemplos de processos que podem ser digitalizados são a gestão do ciclo de receita e o payroll.
2. Insights alimentados por inteligência artificial (design e governança)
Adoção de capacidade preditiva e agentes funcionais de IA para impactar usuários proativamente; relatórios e narrativas automatizadas para eliminação de tarefas redundantes, fornecimento de registro digital de auditoria e a promoção de conversas naturais semelhantes às humanas por meio da IA generativa.
3. Novas exigências de habilidades e competências
A democratização de ferramentas analíticas deve liberar tempo para a análise avançada do negócio e entregas mais qualificadas. Consequentemente, o Chief Financial Officer estará mais envolvido com tarefas estratégicas, como a relação com investidores, estratégias de M&A, gestão de liquidez e certificação e controles internos.
O redesenho da área financeira tendo como base as alavancas acima é capaz de gerar vantagens claras para o negócio, alinhado com as oportunidades da reforma tributária. Uma governança aprimorada, por exemplo, pode economizar até 40% dos custos, enquanto a melhora da eficiência dos processos é estimada em até 50%, seguida pela economia do tempo da ordem de 20% devido à automatização.
Com a consolidação de sistemas e ferramentas, o tempo gasto na resolução de problemas cai até 25% e o custo com fornecedores, até 50%. A partir da digitalização, a automação pode responder pela economia anual de até 20% dos custos e até 30% da melhora de produtividade.
Os ganhos são observados também em uma gestão de dados otimizada. A precisão das informações geradas sobe para quase 100%, com alto nível de acurácia na capacidade de análises e relatórios e maior agilidade no planejamento das ações.
O contexto da reforma tributária
Como um dos componentes da transformação da função financeira, a reforma tributária avança para simplificar e reduzir as obrigações tributárias, substituindo os cinco tributos sobre consumo atuais (PIS, Cofins, ICMS, IPI e ISS) por apenas dois principais: IBS e CBS, além do imposto seletivo. A nova regulamentação começa a entrar em vigor em janeiro de 2026 e passará a valer integralmente em 2033.
Tal simplificação é extremamente necessária, pois é sabido que o Brasil tem um dos sistemas tributários mais complexos do mundo. No entanto, essa mudança pode trazer impactos significativos nos negócios, visto que as empresas aprenderam a encontrar caminhos e fazer uso de alguns mecanismos dos tributos atuais (por exemplo, incentivos fiscais) para identificar ganhos que se revertem em diferenciais competitivos na lucratividade.
Ainda, do ponto de vista tecnológico, a mudança do sistema tributário traz a necessidade de estabelecer novas rotinas e processos, considerando a nova metodologia de cálculo (baseado no preço líquido de produtos e serviços). Assim, a análise profunda dos impactos nos sistemas ERPs e serviços satélites é fundamental.
Por todos esses motivos, não é exagero afirmar que a reforma tributária vai impactar as empresas estruturalmente, com reflexos em vários departamentos, como jurídico, marketing, procurement, manufatura e logística, para além da própria área de finanças. Será necessário, portanto, que todas as áreas dialoguem em busca de respostas conjuntas sobre como se adaptar.
Reforma tributária na área financeira
Desafios
Um dos principais desafios da Reforma está na análise do fluxo de caixa, considerando a monetização dos créditos tributários atuais, a adoção da metodologia do “split-payment” nas vendas e a postergação no momento de aproveitamento dos créditos.
Os custos operacionais também chamam a atenção. As mudanças em processos e o investimento em adaptações de sistemas e treinamento devem ser feitos, bem como uma busca de otimização de custos através da automação dos processos.
O relacionamento com stakeholders também representa um desafio. A necessidade de comunicação clara com fornecedores e parceiros e a preparação conjunta para mudanças nos processos de negócios atingirá um novo patamar.
Por fim, a reforma tributária também exigirá uma revisão da estrutura de preços dos produtos e serviços, considerando os potenciais impactos nos custos dos insumos bem como as variações na carga dos produtos e serviços vendidos. A identificação de uma boa estratégia de precificação é essencial, visto que variações nos preços podem impactar os resultados operacionais e a competitividade de mercado.
Oportunidades da reforma tributária
Já do lado das oportunidades, podemos destacar um aumento na conformidade fiscal do país pelo mecanismo do split payment e o aumento da transparência, a partir do fortalecimento da confiança dos investidores e stakeholders. Este ganho pode se refletir na melhora da percepção de mercado e até alavancar o valor das ações da empresa.
Na otimização de processos, a adaptação de processos e sistemas pode levar à modernização das operações financeiras e contábeis. Por fim, a expectativa é que a conformidade com a nova regulamentação abra portas para novos incentivos ou programas de apoio, diferenciando os bons contribuintes.
Conclusão
A transformação da função financeira nas empresas é uma jornada complexa que não pode ser resolvida com soluções simples. O novo papel dos CFOs, que agora participam ativamente das discussões estratégicas, torna essa transição ainda mais crucial. A reforma tributária, com suas implicações profundas, exige que as empresas reavaliem suas operações financeiras e adotem soluções tecnológicas que não apenas atendam às novas regulamentações, mas também criem valor sustentável. Em um ambiente de negócios cada vez mais dinâmico, as oportunidades geradas pela reforma tributária, como a otimização de processos e a melhoria da gestão de caixa, devem ser aproveitadas. Portanto, a combinação de tecnologia, dados e novas competências será fundamental para que as empresas não apenas se adaptem, mas prosperem neste novo cenário.